quinta-feira, 5 de maio de 2011

Carta de amor nunca enviada

E não é que as coisas ficaram claras agora? Mas por que agora? Por que agora? Bom, talvez eu seja mesmo Anna Karenina, meio assim transgressora, meio assim suicida, vagando pela linha do trem sabe -se lá até quando. A palavra “futuro” amarga no fundo da boca - um contraste incessante com a concupiscência exalada dos poros do corpo todo e o hálito de “carpe diem”. “Meu Deus, por quê?” – pergunto aos brados. Hoje, a gotícula de suor na ponta da tua franja mirando meus seios ainda arfantes. Amanhã, nenhuma foto na sala de estar, nenhuma inscrição em lápide alguma, nenhuma canção tocando na rádio preferida, nenhuma meia tua na minha gaveta, nenhuma teia tua nos meus dias. Depois de amanhã, quem sabe, só um nome balbuciado em vão entre um copo e outro num dia ruim. Alguns amigos saberão e cumprirão o pacto de jamais no tocar no assunto. Ou seja: nada que não nos tenha acontecido antes. Nada que não tenhamos superado antes. Nada que não tenhamos esquecido antes. “Meu Deus, então... por que dói tanto?”... se  essa é só mais uma dor nesse universo de coisas intangíveis?... se é só a racionalidade vindo à tona?... se a felicidade ao alcance das mãos é a melhor? E eu, que sou os pássaros voando, seguirei pro alto ou rumo à luz do túnel. E eu, que sou meio poeta, meio literata, meio babaca, talvez te imortalize em alguns versos jamais publicados. E eu, que me lancei nos teus braços com a pieguice de quem ainda acredita amar, talvez um dia te veja cruzando a esquina num rosto desconhecido, pergunte por ti a algum amigo, te dê bom dia com a diplomacia de antigo romance cortês, procure teu nome no Google. E assim cumpriremos o ritual de paixões fracassadas que insistiremos em negar aos que perguntem por ela. E assim fingiremos não nos importarmos se as marcas da nossa pele roçarem em outros rostos. E assim seguiremos a vida como seguem as coisas que não têm sentido. Até o dia em que nos queixaremos: “por que não tentamos um pouco mais?”. Mas... aí... é difícil. Aí é tarde demais. O telefone irá tocar; a realidade estará consumada; não haverá mais espaço na memória. E ninguém entenderá por que seguirá doendo... 

Um comentário:

  1. Cartas não-enviadas...quem perde é o destinatário...quem ganha é o leitor. Parabéns!

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